Vivemos em uma sociedade repleta de contrastes, onde os papéis sociais são rotulados e as pessoas facilmente divididas entre “os bons” e “os maus”, como se a vida real fosse um tribunal maniqueísta. Mas a verdade é que a linha que separa o cidadão de bem do réu não é tão sólida quanto se imagina. Qualquer um de nós, diante de um erro, de uma acusação injusta ou de uma tragédia pessoal, pode se ver sentado no banco dos réus — culpado ou inocente. É nesse cenário de incerteza e fragilidade humana que se ergue a figura do advogado.
Advogar não é profissão para os fracos. É missão. É resistência. É carregar nos ombros a dor alheia, acolher no silêncio do escritório as misérias humanas e, ainda assim, manter-se firme, ético e combativo. Quem procura um advogado não o faz em momentos de celebração — ninguém entra num escritório jurídico para levar flores. Ali se entra com o coração pesado, o medo estampado no rosto e a esperança murcha entre os dedos.
E quando esse cliente sai pela porta mais leve, é porque toda a carga emocional que trazia consigo foi transferida, muitas vezes sem perceber, para os ombros daquele que escolheu ser advogado. Sim, o advogado é aquele que escuta o que ninguém quer ouvir, enfrenta o que muitos preferem evitar e carrega a responsabilidade por uma vida que pode ser destruída por uma sentença.
Não existe lado bom ou lado ruim da sociedade. Existe o ser humano — falível, complexo, contraditório. E, diante da lei, o que se espera é justiça — não julgamento moral. A função do advogado é justamente garantir que cada indivíduo, independentemente de sua história, tenha o direito de ser ouvido, defendido e respeitado.
Por isso, dizer que o advogado defende “bandidos” ou que escolhe um lado sombrio da sociedade é ignorar a essência da Justiça. O advogado não está ali para julgar, mas para garantir que o julgamento seja justo. Seu papel é assegurar que a Constituição seja cumprida, que os direitos sejam respeitados e que o processo legal não seja reduzido a um espetáculo de condenações sumárias.
Defender não é concordar. É proteger a dignidade humana. É garantir que, mesmo nos momentos mais sombrios, o ser humano tenha o direito à defesa — porque, sem isso, não há civilização, não há democracia, não há justiça.
Ser advogado é estar ao lado da dor sem ser dominado por ela. É ouvir histórias de abandono, violência, falência, preconceito e perda, e ainda assim erguer-se para lutar. É mergulhar no sofrimento alheio e tentar resgatar dali um fiapo de justiça.
Por tudo isso, a missão do advogado é sagrada. Porque é ele quem empresta a voz a quem não tem. É ele quem entra na arena da lei para enfrentar o Estado, a sociedade, o preconceito, o descaso e, muitas vezes, a indiferença. O advogado é aquele que resiste quando todos já condenaram. É aquele que ainda acredita, mesmo quando tudo parece perdido.
E assim seguirá sendo. Enquanto houver injustiça, haverá necessidade da advocacia. Enquanto houver sofrimento, haverá alguém precisando de defesa. Porque advogar é mais que uma profissão. É um sacerdócio.