“Todo ano é a mesma promessa, mas não sai do papel”, foi assim que Lucimaira da Conceição, moradora do conjunto Santarém, definiu a situação após sofrer, mais uma vez, com as consequências de chuvas intensas na capital. Ela, assim como outros natalenses, sofre com os impactos negativos da falta de estrutura e preparo para intensas chuvas que podem atingir o município.
O cenário de desastre, de lama pelas paredes, móveis destruídos, marcas de água nas paredes era o que se encontrava pelas ruas. Na tarde desta terça-feira (28), a reportagem do Diário do RN encontrou moradores aproveitando a trégua da chuva para construir barricadas na porta de casa na tentativa de conter o avanço da água e não ter ainda mais prejuízos, caso voltasse a chover forte.
Dona Terezinha Lúcia, 66 anos, moradora do conjunto Parque das Dunas, compartilha do sentimento de impotência e do desespero de ver sua casa revirada pela chuva: “Perdi meus móveis, mesa, cadeiras e rack. A marca da água ainda está na parede, minha casa está muito desorganizada, eu sou humilde mas gosto de tudo organizado e a minha casa está nessa situação. Estou tentando convencer meu esposo a se mudar, já moro aqui há 27 anos, mas não aguento mais perder minhas coisas. Com essa, é a terceira vez que sofro com essa falta de estrutura”.
No bairro do Igapó, o cenário era o mesmo: tentativa de limpeza das casas, móveis pendurados e aparelhos eletrônicos desligados com medo de perder. Foi assim que a moradora da rua Nossa Senhora do Ó, teve que tentar reorganizar a vida após o susto da noite anterior: “Fui muito tumultuado, desesperador, um desespero total de a gente perder os móveis que temos em casa, com medo de sofrer algum acidente por causa da água, parecia uma enchente e eu comecei a chorar. Mesmo com os vizinhos ajudando, eu entrei em pânico. A obra está parada e com a chuva fica ainda pior… com os vizinhos fizemos uma força-tarefa para pendurar os móveis”.
O sentimento de desespero foi o que tomou conta de Francisca Eliane Gonçalves, dona de casa, 55 anos, moradora do bairro Potengi: “A situação era horrível, chorei muito, vi minha casa toda melada de lama, cheio de água… Acordei no susto e chamando meu marido que estava dormindo, uma gritaria grande, chamando os vizinhos, um corre-corre por causa da água, não deu para pegar nada”.
REVOLTA
O sentimento entre as pessoas que perderam meus pertences em mais um episódio de chuva é de muita revolta, por promessas não cumpridas: “A gente se sente enganada porque todo ano é a mesma promessa, mas não sai do papel. Todo ano eles falam que a gente vai ter uma praça linda, de lazer, vai ajeitar a lagoa, mas nunca isso acontece. Quando a enchente vem, apenas dá uma cesta básica, um colchão, um kit de limpeza e acabou. E as nossas coisas, que a gente compra com tanto sacrifício? Não temos o direito de ter uma cama, não temos o direito de ter um armário, um guarda-roupa”, declarou Lucimaira da Conceição, autônoma, 31 anos.
Verônica Macêdo, 49 anos, moradora do conjunto Santarém afirma que o que é feito não resolve a situação: “A perda na minha casa foi quase total. A água chegou a 1,60 cm, perdi colchão, cama, um colchão ‘especial’ para a minha mãe que fez uma cirurgia recentemente. A situação é bem difícil, porque não deu tempo de tirar nada dela, até os remédios do coração a gente perdeu com a chuva. Agora é batalhar tudo de novo, porque se for depender de órgão público, municipal, estadual, a gente não tem mais nada. Eles chegam e dão cesta básica, colchão, um paliativo, mas a situação eles não resolvem, a gente sabe que tem dinheiro, mas eles não fazem porque não querem mesmo”.
CHUVAS EM NATAL
Segundo dados da Cemaden, em Natal foram registrados 241mm em 24h, valor quase 10 vezes maior do que a média de chuva considerada normal para o mês de novembro. Desde a noite de segunda-feira, a prefeitura instalou um Comitê de Crise para acompanhar de perto os transtornos gerados pela intensa chuva. Ao todo, pelo menos 60 pessoas estão desabrigadas devido às precipitações. Durante a tarde desta terça-feira (28), a Prefeitura de Natal publicou em edição extra do Diário Oficial o decreto que estabelece, pelo prazo de 90 dias, situação de emergência no município. O texto do decreto prevê ainda a possibilidade de ser prorrogado por igual período situação de emergência nas áreas do município afetadas por chuvas intensas.