Por Bruna Torres
Na velha Ribeira, o abandono é escancarado a cada viela em inúmeros prédios históricos deteriorados pela falta de manutenção, acúmulo de entulho, muito lixo, descartes dos mais variados materiais, muitos de consumo humano, além do notável descaso na conservação de um bairro que não se define apenas em uma localidade, mas por ser o berço da cultura e arte do Rio Grande do Norte, que ainda existe e resiste.
Para muitos, a Ribeira faz parte de sua própria história de vida história, como Jaufran Júnior, proprietário do restaurante Novo Grill, que analisa as mudanças também vivenciadas por ele, em função do comércio da família do empreendimento há 30 anos, tendo acompanhado inúmeras dessas transformações.“A Ribeira de hoje, pensando 30 anos atrás, não é a mesma nem de longe.
Era um bairro com mais movimentação. Hoje está resumido basicamente a três repartições públicas e ao cais. Nós deixamos de abrir no sábado porque não tem movimento. Então não compensa mais, antes ficávamos até tarde da noite aqui porque tinha movimento. Uma vez que sai o comércio, saem as repartições públicas e quando elas saem, o que sobra é apenas a possibilidade em cada esquina ser um ponto de droga, um ponto de crime”.
A insegurança como consequência do abandono se repete em outros relatos. “Na Ribeira está uma total falta de segurança. Os bandidos roubam tudo, a gente tem que ter cuidado. As pessoas deixam de vir para cá por medo, pela insegurança, pelo medo de ser roubado”, lamenta José Ricardo, mecânico da oficina Dois Amigos, localizada nas proximidades da Rua Frei Miguelinho, na Ribeira.
Ele detalha que, por vezes, é necessário que alguém durma no prédio da oficina para garantir a segurança, sem que peças e automóveis sejam furtados, um medo que já está atingindo a clientela que aos poucos vai deixando de frequentar o bairro, prejudicando os comerciantes locais.
O empresário Jaufran afirma ter esperanças diante dos diálogos sobre uma revitalização na Ribeira, mas ele acredita que precisa ser uma parceria público-privada.
“O Poder Público não vai sair revitalizando todos os prédios, isso depende também dessa iniciativa privada. O que cabe ao Poder Público é garantir a segurança. Então, você gera esse movimento na Ribeira, os prédios passam a ter mais valor, passam a ser revitalizados. Mas, sem esse conjunto de uma iniciativa privada com a pública, não tenho muita esperança que vai ter alguma melhoria, não”.
Na Rua Chile, um dos ‘points’ da vida noturna na ‘cidade baixa’, ainda resistem casas de show que vão do samba ao dance music. As proprietárias do Rosas na Cartola, Brígida Paiva e Gláucia Wanderley, relatam que ter um negócio na Ribeira é realmente reacreditar no processo de reconstrução da Ribeira.
“Esses processos de reabrir são a longo prazo, até percebermos que a Ribeira está revitalizada, e a gente vem percebendo que a partir do primeiro passo da iniciativa privada, como a gente, vem começando a reabrir, tudo isso tentando movimentar a Ribeira também. Aqui existem mais questões de furto, por abandono pelo Estado, pela Prefeitura. Mesmo sendo um processo de longo prazo, os movimentos culturais aqui estão voltando, mas acredito mesmo que vai voltar”.
Insegurança ameaça manutenção da Casa da Ribeira
Dentre as expressões e manifestações culturais na Ribeira, o abandono e a criminalidade também afetam artistas e produtores potiguares. No último domingo (7), a Casa da Ribeira sofreu, mais uma vez, uma tentativa de furto. A ação da PM foi rápida e conseguiu chegar ao local e prender o ladrão em flagrante, mas os danos não puderam ser evitados. O criminoso cortou as mangueiras de gás, os fios de cobre e fiações elétricas, gerando um prejuízo de, até o momento, quase R$ 4.000,00. Em outros dois furtos de equipamentos de ar-condicionado, o prejuízo foi de R$50.000,00 e, por pouco, não fechou as portas do espaço cultural.
Na segunda-feira (09), o presidente da Casa da Ribeira, Henrique Fontes, desabafou nas redes sociais e junto a equipe, conversaram sobre formas de manter o funcionamento da Casa. Uma vaquinha foi iniciada para arrecadar fundos para compra de materiais e pagamento de mão de obra para reparo e reforço de segurança. “Assim, a diretoria está reunida e vendo a viabilidade de continuar o funcionamento da nossa Casa na Ribeira, num bairro que vem sendo sistematicamente abandonado pelo poder público. Em 23 anos de funcionamento, esta seria a segunda vez que a Casa da Ribeira seria inviabilizada por razões externas à nossa gestão que, mesmo diante de uma realidade precária da nossa política pública para a Cultura no estado do Rio Grande do Norte e na cidade de Natal, funciona realizando espetáculos, festivais, cursos, oficinas e demais eventos culturais que vocês acompanham”.