A construção de uma Estação Elevatória de Esgoto (EEE) na rua João Paulo II, no bairro de Nova Esperança, em Parnamirim, não teria, por via de regra, nada que chame a atenção, mas o que era só um canteiro de obras com trabalhadores e suas máquinas virou “atração turística” na região.
Desde a última quarta-feira (25), moradores da região e de bairros vizinhos vêm às dezenas para admirar a água de cor azul-turquesa depositada no fundo de um buraco. Sem saber o que causa a coloração tão exótica – e que lembra a de praias famosas mundo afora – alguns visitantes atribuem a descoberta a um “presente divino” para a região.
“É algo extraordinário, uma beleza, uma natureza que estava aí quietinha (sic) e quando mexeram a água fluiu. Agora é cuidar desse presente que Deus nos deu”, comentou José Antônio, que é mototáxi e mora a mais de 40 anos na região.
No entanto, o “Buraco Azul” de Parnamirim, como os populares estão chamando, pode ter obtido essa coloração a partir da contaminação do aquífero na região e o surgimento, pode estar relacionado à imprecisões no laudo hidrogeológico que esse tipo de obra precisa ter para sua realização.
Aquífero, explica o professor José Braz Diniz Filho, do Departamento de Geologia da UFRN, é uma formação geológica subterrânea que armazena água da chuva durante muitos anos. Para o professor, a escavação aparentemente atingiu o nível freático deste aquífero e provocou o surgimento desta água.
Perguntado sobre a coloração exótica da água, Braz lembra que a água pura é transparente, mas que quando recebe a luz do sol apresenta um tom levemente azulado e cristalino. Entretanto, a cor do “Buraco Azul” é um turquesa e, para o professor, a hipótese mais provável é que a água esteja contaminada. “O próprio aquífero pode estar contaminado com nutrientes, como o nitrogênio proveniente de fossas ou de alguma atividade agrícola na superfície. Esse nitrogênio, ao longo do tempo, alcança o nível freático do aquífero. Com esses nutrientes na água subterrânea, no subsolo, se você escava e expõe o nível freático, eles formam, com a luz solar e água parada um ambiente propício para a proliferação de algas que podem dar aquele tom azul-esverdeado”, completou o professor Braz.
Ele ainda explicou que o esperado em situações como essas é que os resultados mostrem se a contaminação é apenas local ou em todo o aquífero. Perguntado sobre outros lugares que apresentam esse tipo de coloração da água, o professor explica que existem outros fatores que podem colaborar como solos ricos em calcário, como em cavernas, no entanto essa não é uma característica da região. O professor Braz Diniz finaliza dizendo que são necessárias análises do solo e da água para ter certeza do que realmente provocou o fenômeno.
A Caern esteve no local e realizou coletas para análise da água e os resultados estão previstos para o final da próxima semana. A companhia se pronunciou através de nota onde reforçou que a obra é de responsabilidade da gestão municipal e, por isso, não entraria em detalhes. A companhia ainda reforçou que as obras foram paralisadas e o perímetro isolado para evitar acidentes.
De acordo com o engenheiro ambiental Gilbrando M. Trajano Junior, toda obra é passível de impactos sociais e ambientais. “Apesar de não ter ido na área de intervenção e não ter maiores detalhes sobre a obra, aparentemente, ao meu ver, dentro da perspectiva inicial de planejamento da obra e de seus possíveis impactos, critérios como o nível do lençol, via testes e sondagens prévias não conseguiram caracterizar de maneira efetiva a área”.
No entorno da obra, chama atenção a ausência de uma placa onde, de acordo com a Lei Federal 5.194/66, deveria constar o nome do profissional responsável, autores e coautores do projeto em todos os seus aspectos técnicos e artísticos, assim como os nomes dos responsáveis pela execução da obra e/ou serviços.
Apesar da lei, a Prefeitura de Parnamirim, responsável pela obra, afirmou que são 23 estações elevatórias que fazem parte do projeto de saneamento e que não precisaria ter 23 placas, apenas uma onde estariam as informações do projeto como um todo. Outros questionamentos enviados sobre a elaboração dos laudos prévios e riscos aos moradores não foram respondidos até a conclusão desta matéria.
Ainda sobre a questão das placas, o gerente de fiscalização do Crea-RN, Heulyson Arruda, confirmou à reportagem do Diário do RN que: “É obrigatório a fixação da placa por parte da empresa executante do serviço, a ausência da placa configura infração e ela [a empresa] está sujeita a autuação e multa”. O gerente de fiscalização completou afirmando que o cidadão que encontrar uma obra sem placa pode denunciar no site do órgão, atendimento via whatsapp: (84) 9128-3827 ou de forma presencial na sede ou nas inspetorias.
A empresa AGaspar, responsável pela execução da obra, não foi localizada.