A parada militar realizada nesta quarta-feira (3), diante da Cidade Proibida, em Pequim, foi cuidadosamente desenhada para enviar uma mensagem clara: a China quer ocupar o centro de uma nova ordem mundial.
Diante de ditadores aliados e representantes de dezenas de governos estrangeiros, Xi Jinping transformou o desfile em um ato político — complementando a ofensiva diplomática recente que aproximou Pequim de países incomodados com a política de “América em primeiro lugar” do presidente Donald Trump.
Blindados modernos, tanques de última geração, drones com inteligência artificial, caças e mísseis hipersônicos desfilaram diante do líder chinês. Foi um lembrete de que o poderio militar agora acompanha o peso econômico e diplomático já conquistado por Pequim.
“Hoje, a humanidade se depara mais uma vez com escolhas cruciais: paz ou guerra? Diálogo ou confronto? Cooperação vantajosa para todos ou rivalidade de soma zero?”, declarou Xi.
“O povo chinês está firmemente do lado certo da história e do lado da civilização e do progresso humanos.” Embora não tenha citado Washington, o contraste com a retórica isolacionista de Trump ficou evidente.
O presidente russo Vladimir Putin e o ditador norte-coreano Kim Jong-un assistiram ao desfile ao lado de Xi, em posição de honra. A presença de Kim, que não visitava Pequim desde 2019, teve peso simbólico: foi a primeira vez que ele participou de uma cúpula multilateral desde que assumiu o poder, em 2011.
A cena reforçou a percepção de que regimes sob sanções ocidentais encontram em Pequim um eixo de sustentação.
Moscou, enfraquecida pela guerra na Ucrânia, depende cada vez mais da economia chinesa. Pyongyang continua vivendo à sombra da China, ainda que recentemente tenha intensificado a cooperação militar com a Rússia, enviando armas e soldados para o front – em troca de ajuda econômica e tecnológica.
O elo comum não é ideológico, mas estratégico: frear a hegemonia americana. E, nesse projeto, todos são obrigados a reconhecer a China como protagonista.
Trump reagiu com sarcasmo nas redes sociais, acusando Xi, Putin e Kim de conspirar contra os EUA. O Kremlin tentou minimizar a situação, mas as imagens dos três autocratas lado a lado, diante de mísseis capazes de cruzar oceanos, falam por si.
O pano de fundo, que dá uma oportunidade de ouro para o avanço chinês, é a política isolacionista de Trump.
Ao insistir em colocar a “América em primeiro lugar”, o republicano aliena não só rivais mas também potenciais aliados, abrindo espaço para Pequim se oferecer como alternativa pragmática e com menos exigências políticas – inclusive com relação a valores democráticos, visto que o Partido Comunista da China continua controlando o país com mão de ferro.
Dias antes da parada militar, a Organização para a Cooperação de Xangai já havia reunido numa cúpula o próprio Xi Jinping, Putin e o premiê indiano Narendra Modi.
A presença de Modi, líder da maior democracia do mundo, sinaliza que até a Índia considera maior alinhamento com a China – um rival de décadas com os quais os indianos já travaram guerras – diante das tarifas e sanções impostas recentemente por Washington.
As imagens de Xi, Putin e Modi lado a lado reforçam ainda mais a leitura de que a estratégia isolacionista de Trump pode, paradoxalmente, acelerar o avanço chinês rumo a uma nova ordem mundial.
*Com informações de CNN