Na noite de 15 de junho de 2017, o Rio Grande do Norte perdia a ex-governadora Wilma de Faria, aos 72 anos. A “Guerreira”, como ficou conhecida em todo o RN, sucumbiu vítima de falência múltipla de órgãos após dois anos de luta contra um câncer no sistema digestivo, que a afastou das funções políticas em suas últimas semanas de vida. Tendo iniciado na política em 1985, quando disputou a Prefeitura de Natal e perdeu, ela foi eleita deputada federal na Assembleia Constituinte no ano seguinte. A partir daí, Wilma construiu uma carreira política de sucesso, sendo a primeira mulher a ser eleita prefeita de Natal – por três mandatos, e governadora do Estado. Ela também foi a primeira mulher a ser reeleita no RN, para os dois cargos citados, alcançando outro feito histórico.
Nascida em 17 de fevereiro de 1945 em Mossoró, foi casada com o ex-governador Lavoisier Maia, com quem teve quatro filhos: Ana Cristina, Márcia, Lauro e Cíntia. É Márcia, atual presidente da Agência de Fomento do Estado, quem relembra o pioneirismo de Wilma na política potiguar. “Ela é, sem dúvida, uma das personagens mais importantes da história política do nosso Estado, não apenas pelo lugar de representatividade que alcançou, mas principalmente, por ter sido uma pioneira neste lugar de hostilidade às mulheres, como ainda é a política”, disse.
Para Márcia, o papel exercido por Wilma de Faria na política potiguar foi importante não apenas dentro do Rio Grande do Norte, mas abriu as portas da política para as mulheres em todo o Brasil, onde, infelizmente, ainda impera uma cultura machista e misógina em todos os setores. “Aquela mulher corajosa, forte, inspiradora, protagonista e ousada precisou enfrentar muitos desafios, preconceitos e barreiras que a sociedade impõe até hoje. No passado, não se permitia o debate amplo como hoje e foi preciso vir mulheres como ela para desbravar, abrir portas, abrir caminhos até então pouco ou nada explorados”, afirmou.
No dia em que completa seis anos de seu falecimento, a “Guerreira” é relembrada por Márcia não apenas como a pioneira da política potiguar, mas como mãe e pessoa que era. “A data da partida de mamãe é sempre um momento mais dolorido, de mais introspecção, mas ao mesmo tempo, de compartilhar do carinho, do amor, da gratidão de muitos admiradores e fãs da história construída por Wilma. A saudade dela ainda persiste, porque ela é a memória de uma mulher que, acima de tudo, lutou com orgulho, honra e humildade para fazer do nosso Estado e da nossa sociedade um lugar melhor”, declarou.
A importância de Wilma de Faria para a abertura da política norte-rio-grandense para as mulheres foi lembrada pela governadora Fátima Bezerra (PT), terceira mulher a ser eleita para o cargo no Estado: “Dona Wilma de Faria foi e sempre será uma pioneira na representatividade feminina na política do Rio Grande do Norte. Ela teve uma ampla participação seja no Legislativo, seja no Executivo. Em sua carreira, deixou uma marca expressiva como chefe do Executivo de Natal, bem como quando se tornou a primeira governadora do nosso Estado”, disse.
A governadora citou ainda a trajetória de Wilma antes da política, uma vez que esta era professora, especialista em Sociologia e mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). “Ela sempre será lembrada por sua trajetória não só na política, como também na docência, uma vez que foi também professora da UFRN. Mulher e gestora de olhar sensível, pioneira em algumas ações, inclusive em relação às comunidades e pessoas em vulnerabilidade”, relembrou Fátima Bezerra.
Lidereranças relembram carreira de sucesso de Wilma de Faria na política
Wilma de Faria entrou no mundo da política ao se tornar primeira-dama do Estado, em março de 1979, após a posse de seu primeiro marido, Lavoisier Maia. Em 1986, ela se elegeu pela primeira vez, como deputada federal na Assembleia Constituinte. No cargo, foi reconhecida por sua atuação em defesa dos direitos sociais e da classe trabalhadora ao figurar na lista “Deputados nota 10”, distinção concedida pelo Departamento Intersindical de Assuntos Parlamentares (DIAP). O fato foi relembrado pelo presidente da Assembleia Legislativa do RN, deputado estadual Ezequiel Ferreira (PSDB).
“Secretária de Estado, deputada federal constituinte, prefeita de Natal, governadora do RN, vice-prefeita e vereadora. Poucos políticos do Rio Grande do Norte têm este histórico. Wilma de Faria soube ocupar o espaço público como ninguém. Exemplo de determinação, trabalho, ousadia, idealismo e muita garra. A guerreira como gestora se mostrou competente, mais ainda em se relacionar com o povo. Sem temor, tratava frente a frente com os poderosos e acolhia os mais simples. Wilma exemplo de mulher potiguar”, relembrou.
Em 1988, Wilma foi eleita a primeira prefeita de Natal, feito que voltaria a repetir em 1996 e 2000, ao ser reeleita. Na metade do terceiro mandato, renunciou e disputou o governo do Estado em 2002, sendo eleita a primeira mulher governadora do Rio Grande do Norte a partir de 2003. Em 2006, foi reeleita, em outro feito pioneiro para as mulheres potiguares. O prefeito de Natal, Álvaro Dias (Republicanos), falou sobre a representatividade exercida por ela na política.
“Dona Wilma foi uma figura marcante na vida política do RN, sobretudo pela sua combatividade. Eu que a enfrentei e militei ao seu lado, posso assinalar como ela não se deixava intimidar diante dos seus adversários”.
Garibaldi Filho
Ex-governador/RN
“A ex-governadora e ex-prefeita Wilma de Faria é uma figura das mais marcantes da História contemporânea da política no Rio Grande do Norte. Primeiramente como deputada constituinte, depois como a primeira mulher a ser prefeita de Natal e também a primeira mulher a governar o Estado, Wilma sempre carregou as marcas da bravura pessoal, do destemor político e do empenho em favor das pessoas. É uma personagem relevante que faz muita falta no atual debate público e na representação política do Rio Grande do Norte”, afirmou Álvaro.
Para o ex-governador Garibaldi Alves Filho (MDB), o espírito combativo de Wilma é um exemplo para os políticos do Estado. Em 1985, ambos se enfrentaram para a Prefeitura de Natal, quando o futuro “governador das águas” foi eleito prefeito. Um ano depois, Wilma se elegeu deputada federal. Em 1996, ela voltou a ser eleita prefeita de Natal, sendo reeleita em 2000, com o apoio de Garibaldi. Eleita governadora em 2003, ela se reelegeu em 2006, quando derrotou o ex-governador no segundo turno, quebrando a invencibilidade eleitoral de Garibaldi.
“Wilma foi uma pessoa obstinada no campo político e é lembrada como uma prefeita aplicada e zelosa. Do ponto de vista social, por vocação, procurou sempre estar perto dia que precisavam mais. Faz falta à política do RN”
José Agripino
Ex-governadro
“Dona Wilma de Faria foi uma figura marcante na vida política do RN, sobretudo pela sua combatividade. Eu que a enfrentei e militei ao seu lado, posso assinalar como ela não se deixava intimidar diante dos seus adversários. Por isso, não posso deixar de lamentar o que aconteceu, quando recebeu uma ínfima votação para vereadora. O caminho encontrado pelas mulheres, no seu pioneirismo, teve em Wilma o seu principal sustentáculo. Tínhamos também a presença do preconceito machista enfrentado por Wilma. Lembro-me bem que, ao chegar em Felipe Camarão, na companha de 1985 e me deparei com meus correligionários querendo que eu subisse o morro que circunda o bairro, uma vez que ‘a mulher’ (Wilma) tinha escalado o morro”, relembrou Garibaldi.
Quando venceu a disputa pela Prefeitura de Natal em 1996, Wilma recebeu apoio do então senador José Agripino (União Brasil). Ele relembra, com saudosismo, o espírito perseverante e incansável da “Guerreira”. “Wilma de Faria foi uma pessoa obstinada no campo político e é lembrada como uma prefeita aplicada e zelosa. Do ponto de vista social, por vocação, procurou sempre estar perto dia que precisavam mais. Faz falta à política do RN”, afirmou.
O atual presidente da Petrobras, ex-senador Jean Paul Prates (PT), fixou residência no RN após ter sua proposta de desenvolvimento para o setor energético, com fontes renováveis e a revitalização do setor de petróleo, adotada pela então governadora, em 2003. “Wilma de Faria foi uma visionária no setor das energias renováveis, abrindo caminho para o desenvolvimento de uma indústria que colocou o Rio Grande do Norte na linha de frente da transição energética. Eu tive a honra de ser o titular de uma secretaria inovadora que estabeleceu as bases que viabilizaram inúmeros projetos de energia eólica e solar, contando com total apoio e estímulo da ex-governadora”, assegurou.