O Agosto Lilás, mês dedicado a alertar sobre o fim da violência contra a mulher, e que também marca o aniversário de 19 anos da Lei Maria da Penha, foi tema da entrevista com a ministra das Mulheres, Márcia Lopes, durante o programa Bom Dia, Ministra desta quinta-feira (31).
O mês pretende dar visibilidade ao tema e ampliar a divulgação sobre os direitos das mulheres em situação de violência, além dos serviços especializados para acolhimento, orientação e denúncia.
Nós temos que erradicar a violência da vida das mulheres com a legislação, com todas as providências que são necessárias, mas nós temos que principalmente colocar as mulheres no lugar onde elas querem estar e respeitar todas as diversidades”, afirmou a ministra
“Para revelar esse potencial que todas as mulheres brasileiras têm, de serem protagonistas da sua vida, da sua história. As mulheres participam, as mulheres são solidárias, as mulheres são capazes de mover o mundo e mover os seus territórios”
A campanha faz parte de uma mobilização nacional permanente do Ministério das Mulheres, envolvendo diversos setores no compromisso de pôr fim à violência contra as mulheres, em especial aos feminicídios, a partir de diversas frentes de atuação (comunicação ampla e popular, implementação de políticas públicas, engajamento de atores diversos).
“O Agosto Lilás marca justamente essa história de luta. Foi pela Maria da Penha no dia 7 de agosto, há 19 anos, quando o presidente Lula promulgou a Lei Maria da Penha, não mudou só no Brasil. A Lei Maria da Penha é conhecida em todo o mundo e marca então essa mobilização, essa resistência das mulheres em relação ao combate a todo tipo de violência. Então nós teremos aí uma série de atividades ao longo desse mês de divulgação, de mobilização, de reflexão, de juntar as mulheres para a gente tratar disso. E queremos, claro, sempre falar com os homens, porque é com eles que a gente vai ter que dialogar também. Nós temos que entender que foi uma determinação histórica mesmo pelo machismo, pelo autoritarismo do mundo e que a gente não pode conceber, achar que isso é natural, que é normal”, declarou.
“Então, em cada situação como essa que aconteceu lá em Natal [agressão de uma mulher pelo então namorado com mais de 60 socos em poucos segundos, dentro de um elevador e que teve repercussão nacional], nós nos estarrecemos e entendemos que é possível sim mudar essa situação. Cada passo é fundamental. E eu tenho conversado com os prefeitos e prefeitas e tenho dito o seguinte: se cada prefeito em cada cidade desse país disser uma vez por dia ‘aqui nesta cidade nós não teremos violência contra a mulher’, isso vai mudar. Então há muitas formas e esse agosto lilás promete muitas atividades, mobilização, conversas, campanhas, a iluminação das cidades, tudo em nome do direito das mulheres terem uma vida plena, digna”, explicou a ministra.
Medidas protetivas
Segundo dados do Mapa da Segurança Pública de 2025, divulgado em junho pelo Governo Federal, o número de feminicídios registrou um aumento de 0,69% em 2024, na comparação com o ano anterior. Foram contabilizadas 1.459 vítimas, contra 1.449 em 2023. A ministra defendeu as medidas protetivas contra agressores para salvar a vida de mulheres vítimas de violência.
“O que a gente percebe primeiro é que as mulheres ainda têm vergonha. Elas se sentem culpadas. Além de sofrerem a violência, elas ainda se sentem culpadas, derrotadas. E o feminicídio, ele quase sempre é o resultado de muitos processos, de um tempo grande em que a mulher está sofrendo a violação, que começa às vezes com assédio moral, com xingamento, com uma ofensa, até que às vezes demora um ano, um ano e meio para que o feminicídio aconteça de fato, que é a pior das formas de violência, a mais trágica. É o ponto final da vida das mulheres e saber que as mulheres morrem por ser mulheres. Então, a implementação das medidas de proteção, elas são fundamentais”.
“Em Foz do Iguaçu, na Patrulha Maria da Penha, a policial me dizia: ‘olha, apesar de terem cinco feminicídios este ano, nenhum feminicídio foi com mulheres que estavam em medida de proteção’. Então, as medidas de proteção são fundamentais. Falta ainda esta rede, porque o Brasil, nessa imensidão de municípios, nem todos têm essa articulação que junta a delegacia, o Ministério Público, o Cras (Centro de Referência de Assistência Social), a Unidade Básica de Saúde. É isso que nós temos que fazer, integrar os serviços. E para a própria mulher, isso acaba não tendo muito sentido ou ela não consegue entender e nem se preparar para ter segurança de denunciar. Ela tem muito medo de perseguição, ela tem medo da violação contra os seus filhos, da agressão contra os filhos. Muitos homens, muitos parceiros, maridos, acabam agredindo os filhos para agredir a mãe, para atingir a mãe. Então, não há dúvida que quanto mais medida de proteção, nós teremos menos feminicídio”, explicou.
Casa da Mulher Brasileira
Uma das ações do Governo Federal acolher e encaminhar mulheres vítimas de violência é a Casa da Mulher Brasileira, destinada a oferecer atendimento integral e humanizado a todas as cidadãs. O local oferece serviços especializados para os mais diversos tipos de violência, entre eles triagem, apoio psicossocial, promoção de autonomia econômica, cuidado das crianças – brinquedoteca, alojamento de passagem e central de transportes. Também é possível contar com serviços de delegacia, juizado, Ministério Público e Defensoria Pública.
Atualmente, há 11 Casas em funcionamento no país, localizadas em Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Fortaleza (CE), São Paulo (SP), Boa Vista (RR), Ceilândia (DF), Sobradinho (DF), São Luís (MA), Salvador (BA), Teresina (PI) e Ananindeua (PA). outras 31 estão em fase de implementação. Desde 2023, o Governo Federal já investiu R$ 389 milhões em novas unidades.
“A previsão é de inauguração de mais seis casas ainda este ano e completando, chegando a 40 até o final do ano que vem. Eu tenho dito que cada dia que se atrasa essa obra é mais uma mulher que deixa de ser atendida e tudo o que nós queremos é que elas se sintam atendidas nesse serviço que é tão importante, porque reúne a Patrulha Maria da Penha, a Defensoria, o Ministério Público, a Delegacia, assistente social e psicólogas que recebem as mulheres, o espaço onde as crianças ficam quando as mulheres são atendidas, o alojamento que as mulheres têm para quando sofrem violência ter ali a proteção. Então nós não podemos titubear e nós não podemos de modo nenhum protelar isso”, afirmou.
Ligue 180
A ministra também abordou o Ligue 180, canal gratuito que funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana, para fazer denúncias ou buscar orientação de forma sigilosa. É possível fazer a ligação de qualquer lugar do Brasil ou acionar o canal via chat no Whatsapp (61) 9610-0180. Em casos de emergência, deve ser acionada a Polícia Militar, por meio do 190.
Não é só a denúncia, mas é a denúncia e o sentido de saber, de ter segurança que ela vai ser encaminhada, que ela vai ser orientada, que todas as políticas públicas vão tratar dessas mulheres”, disse a ministra
“Nós estamos investindo muito em mais tecnologia para que as mulheres liguem, para que elas saibam e se sintam protegidas e acolhidas quando elas ligam no Ligue 180. Elas não fazem só a denúncia, elas são orientadas a serem encaminhadas”, explicou.
Conferência
Durante o bate-papo com radialistas de várias regiões Márcia Lopes destacou a relevância da 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (5ª CNPM), que vai ser realizada após dez anos. Para a ministra, a conferência vai ser um espaço estratégico de escuta, mobilização e construção de diretrizes para a elaboração do novo Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Com o tema Mais democracia, mais igualdade, mais conquistas para todas, a conferência será realizada em Brasília no dia 29 de setembro.
A 5ª CNPM tem como objetivo ampliar a participação feminina na construção de políticas públicas voltadas às mulheres e fortalecer o diálogo entre a sociedade civil e os entes federativos. Entre os principais eixos de discussão estão a igualdade de gênero no trabalho e na vida social, o enfrentamento à violência e à discriminação, a autonomia econômica, o acesso a políticas públicas e a maior presença das mulheres na política e nos espaços de decisão.
A ministra explicou que o encontro nacional é resultado de uma ampla mobilização promovida em todo o país, com a realização de mais de 1.400 conferências livres em municípios e territórios, reunindo mulheres para debater suas realidades, prioridades e propostas.
Cada grupo de mulheres tem a sua especificidade. Nós estamos fazendo isso: conversando, ouvindo, escutando, implementando. As mulheres são solidárias. Elas não têm uma preocupação só com a vida delas, mas com o território, com as vizinhas, com a comunidade”, disse a ministra
A expectativa é de que cerca de 3,5 mil mulheres de todas as regiões do Brasil participem da plenária nacional em Brasília. “Teremos aqui essa representação do Brasil inteiro e queremos, já nesse dia, anunciar o avanço dos estados aderindo ao pacto nacional. Isso é o mínimo que cada estado pode fazer quando tem compromisso com a vida das mulheres”, afirmou a ministra.
Segundo Márcia Lopes, a escuta ativa e a articulação federativa são pilares fundamentais da conferência. “O nosso ministério tem a responsabilidade de acompanhar, coordenar, mobilizar e incentivar que estados, municípios e o Governo Federal tenham um plano nacional. Nós sairemos desta conferência com diretrizes muito concretas, que definirão as prioridades das políticas públicas que terão de ser implementadas e ampliadas.”
Autonomia
Durante a entrevista, a ministra também destacou os esforços do governo na promoção da autonomia econômica das mulheres, por meio de políticas estruturantes de inclusão produtiva. Ela citou iniciativas como o Programa Acredita, do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), que já incluiu mais de um milhão de mulheres; a política nacional de economia solidária; e as parcerias com o Sistema S para capacitação e geração de renda.
“Temos lavanderias comunitárias, por exemplo, que promovem inclusão produtiva nos territórios. Quando a mulher usa a lavanderia, ela libera tempo, mas também encontra ali um espaço de organização, de planejamento, de geração de renda”, exemplificou. “Estamos prevendo novos aportes de recursos no orçamento do ano que vem para ampliar essas iniciativas, fortalecendo o empreendedorismo e a economia solidária.”
Ao longo da entrevista, Márcia Lopes reafirmou o compromisso do Governo Federal com o fortalecimento das políticas para as mulheres. “Esse Brasil tão diverso exige de nós muita capacidade de atenção e competência técnica, de saber chegar nessas mulheres e dialogar para termos respostas cada vez melhores”, disse.
Igualdade salarial
Outro tema tratado pela ministra foi a Lei da Igualdade Salarial, que completou dois anos. A norma estabelece a obrigatoriedade de divulgação de informações salariais por empresas com mais de 100 empregados. A medida é coordenada conjuntamente pelos Ministérios do Trabalho e Emprego (MTE) e das Mulheres com o objetivo de ampliar a transparência e acelerar os avanços na equiparação salarial entre mulheres e homens.
É um importante instrumento para a efetivação de direitos já previsto na Constituição e na CLT, que busca promoção da igualdade de remuneração entre mulheres e homens que desempenham funções equivalentes, combatendo a discriminação salarial e garantindo que as mulheres recebam salários justos e iguais aos dos homens para o mesmo trabalho.
“Isso mudaria muito a vida das mulheres aqui no Brasil, porque as mulheres que exercem a mesma função, ganham de 20 a 30% a menos do que os homens. Isso não tem sentido. Então, nós temos procurado no sentido de que a gente também traga os governadores e os prefeitos para esse debate, para que a gente converse com o setor privado, para que o setor privado, para que o sistema S, procurei o Sebrae, todos os serviços que estão nos estados e nos grandes municípios, para que eles mobilizem a capacidade que as mulheres têm. As mulheres deixarão de ser vulneráveis ou deixarão de ser submissas quando elas tiverem, obviamente, autonomia econômica, quando elas tiverem acesso à informação, à formação, à inclusão em projetos, seja na área urbana, na área de segurança alimentar e nutricional, é uma área muito promissora”, argumentou.