Era 20 de setembro de 2024 quando a draga Elbe depositou os primeiros metros cúbicos de areia da chamada Engorda de Ponta Negra. A obra foi abraçada pelo então prefeito de Natal, Álvaro Dias, como um marco para a economia e o turismo da capital e saiu do papel após mais de um ano de debates intensos e muita polêmica, a maioria relacionada a questionamentos ambientais e possíveis impactos da intervenção.
No final de janeiro, foi o próprio Álvaro Dias – já ex-prefeito – quem fez sua própria inauguração da obra com seu ex-secretário, Thiago Mesquita a tira colo. “Finalizamos a Engorda de Ponta Negra”, comemorou em postagem nas redes sociais. Nos dias e semanas que seguiram, foram muitos registros em fotos e vídeos. Mas não demorou para chegarem as chuvas e com elas o registro de várias intercorrências. Nesses dias, Álvaro passou longe dali. Assim como se cala agora, quando os alagamentos persistem até mesmo em dias de sol.
Mesmo sem ocorrência de chuvas, a área da engorda da Praia de Ponta Negra ficou alagada em vários trechos desde a Via Costeira até o Morro do Careca, durante o último final de semana.
Apenas a alta da maré, ocorrida da sexta-feira (28) para o sábado (29), foi suficiente para uma inundação que deixou poças que continuavam acumulando água pelo menos até a tarde desta segunda (31). De acordo com o secretário de Meio Ambiente e Urbanismo da capital, Thiago Mesquita, porém, essa situação é “completamente normal e esperada”.
“Dados da Marinha do Brasil indicam que as ondas na região chegaram a 2,3 metros nos horários de pico, por volta das 4h e das 16h. Além disso, o coeficiente de marés atingiu 114, classificação considerada muito alta, o que favorece a formação de grandes ondas e correntezas intensas”, afirmou Mesquita.
Ainda segundo o titular da Semurb, esse fenômeno é até mesmo parte da adaptação do aterro, pois ajuda a reduzir a barreira – talude. “Tivemos, neste final de semana, marés altas que atingiram todo o litoral, e deve acontecer isso umas oito vezes durante o ano. E o que aconteceu faz parte, inclusive, da adaptação do aterro, que vai diminuindo o talude de 3.05m, que consequentemente vai suavizar o banho”, disse.
Thiago Mesquita disse ainda que a engorda é mais alta na região da Via Costeira do que nas proximidades do Morro do Careca, o que favorece que a formação de lâminas d’água ocorra em tal região. “A cota longitudinal, no fim da engorda, é mais baixa. A engorda é mais alta no sentido norte (Via Costeira), onde começa com 3,05, na parte central, cai para 2,90 e termina no morro com 2,75”, afirmou. “Vamos nos lembrar que no talude a cota é mais alta (crista) e represa a água, que será infiltrada normalmente”.
A explicação do secretário, no entanto, ignora que os alagamentos não foram registrados apenas na área imediatamente ao lado do Morro, mas em vários trechos ao longo dos mais de 4km de faixa de areia ampliada com as obras da engorda.
O secretário Thiago Mesquita também foi questionado sobre o tempo para a infiltração da água, uma vez que já se passavam mais de 48 horas da inundação e o final de semana foi de sol em Natal, assim como o tempo também permaneceu firme na segunda-feira (31). O titular da Semurb não respondeu a este questionamento.
Alagamento durante chuvas
No dia 13 de janeiro, a Praia de Ponta Negra amanheceu alagada, após chuva de 50 milímetros, em período de 6 horas. Mas esse seria apenas o primeiro episódio de um problema que viria a se repetir outras vezes.
Menos de um mês depois, em 6 de fevereiro, a engorda de Ponta Negra amanheceu totalmente alagada em decorrência de fortes chuvas. Naquela ocasião, de acordo com o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), o acúmulo de água na região foi superior a 90 milímetros. Desta vez, uma espécie de voçoroca se formou próximo ao Morro do Careca. O secretário de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal, Thiago Mesquita, afirmou que o ocorrido foi consequência de uma escavação manual na faixa de areia. Segundo ele, algumas pessoas abriram uma vala para escoar a água acumulada: “Houve a abertura manual de uma pequena vala, na boa intenção de escoar mais rápido a formação dos lagos. Isso acabou comprometendo a estrutura do local. A água desceu num volume muito grande e formou uma voçoroca”
Em 28 de fevereiro foi anunciada a conclusão da obra de drenagem com o objetivo de controlar a vazão das águas pluviais, mas a região não deixou de sofrer com o acúmulo de água. No dia 14 de março, após uma madrugada de fortes chuvas que causaram muitos estragos em vários pontos da capital, Ponta Negra voltou a amanhecer alagada. Com a permanência do tempo chuvoso, o alagamento seguiu por alguns dias.
A Secretaria de Infraestrura de Natal (Seinfra), responsável pela obra de drenagem na área, informou que foram formados “espelhos d’água no aterro hidráulico” de Ponta Negra, como previsto no projeto inicial.
“Foi formado o espelho d’água no aterro hidráulico de Ponta Negra, como previsto no projeto inicial. A água se acumula na areia e infiltra ao longo do tempo. Os 16 dissipadores estão funcionando normalmente, reduzindo a força da água que chega na areia”, explicou o secretário titular da pasta.
ADAPTAÇÕES FUTURAS
Na semana passada, em conversa com equipe do Diário do RN sobre os alagamentos causados na engorda em dias com alto volume de chuvas, Mesquita apontou uma outra solução encontrada pela Prefeitura de Natal para o problema. De acordo com o gestor, devem ser criados três canais subterrâneos para aumentar a sucção. Os canais seriam instalados próximo à Via Costeira, no início da Erivan França e perto do Morro do Careca.
Mais uma vez, o secretário declarou que esse acúmulo de água era previsto, e é comum de acontecer e demandar adaptações, devido à dinâmica costeira. “O projeto é um projeto de engenharia excelente, a execução foi excelente. (…) É natural fazer as adaptações, porque o sistema é natural, a dinâmica costeira é natural, e agora nós estamos exatamente vendo as adaptações”, disse Mesquita que reforçou que os dezesseis dissipadores presentes na praia são suficientes para evitar a erosão devido à água de chuva. “Por isso que formam os espelhos d’água somente em chuvas superiores a 40 mm. Abaixo disso, a gente não tem a formação dos espelhos d’água”, disse.
O gestor ainda destacou que o acúmulo de água é mais evidente em sete pontos e o trabalho seria para aumentar a eficiência deles, que correspondem a 25% do aterro. “Os outros 75% ficam completamente secos em menos de 24 horas”, pontuou.
Entretanto, o titular de Semurb afirmou que não há previsão para execução e levantamento de custos da obra e que as análises sobre esse serviço ficarão a cargo da Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinfra).


