O artigo 37, caput, da Constituição Federal de 1988, preceitua que a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
A moralidade, envolta no interesse social de probidade da Administração Pública, prescreve aos funcionários e servidores que lidam com o bem coletivo (res publica) um comportamento compatível com a função exercida, visando resguardar a confiança na boa administração do erário.
Nessa intelecção, os atos realizados pelos administradores da coisa pública recobram atenção quanto à sua finalidade. Isso porque, a finalidade do ato administrativo praticado deve resguardar o princípio da supremacia do interesse público e de sua indisponibilidade, com o objetivo constante de manutenção e crescimento do bem público administrado.
No claro intuito de resguardar a coisa pública de atos defraudadores e ilícitos, a Lei n. 14.230/2021, que alterou a Lei de Improbidade Administrativa dando novo tratamento a diversos dispositivos legais, passou a abarcar um número cada vez mais crescente de agentes aptos a receber a tutela sancionatória e incursão no ato de improbidade administrativa reclamado pela legislação.
Por sua vez, com a nova redação inserta no art. 1º, § 6º, da Lei n. 14.230/2021, a legislação previu a sujeição às sanções legais por prática de atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade privada que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de entes públicos ou governamentais, previstos no § 5º do mesmo artigo.
A referida expansão de tutela sancionatória prevista no art. 1º, § 6º, da Lei n. 14.230/2021, conclamou para si a responsabilização de entidades privadas que, porventura, venham a praticar ato de improbidade administrativa contra o erário, cujo envolvimento atinja o repasse de verbas públicas ou seu incentivo.
É nessa compreensão ampliativa que se insere as entidades de previdência privada e a possibilidade de responsabilização de seus dirigentes por ato de improbidade administrativa praticado.
A Lei Complementar n. 109/2001 conceitua o regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, como sendo facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal.
As entidades de previdência complementar constituirão reservas técnicas, provisões e fundos, de conformidade com os critérios e normas fixados pelo órgão regulador e fiscalizador.
O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, segundo dicção do art. 2º, da Lei Complementar n. 109/2001.
Essas entidades de previdência privada podem ser de caráter aberto ou fechado. No que se refere especificamente ao de caráter fechado, a legislação explicita que são aquelas acessíveis, na forma regulamentada pelo órgão regulador e fiscalizador, dentre eles os servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores etc.
Assim, a operação e administração da previdência complementar são realizados pelas entidades de previdência privada que possuem responsabilidade pelos seus atos junto à Administração Pública. Com isso, necessário destacar uma figura importante nessa sistemática que é a do dirigente das referidas entidades, posto que, em consonância com a Diretoria Executiva, devem atuar de forma a manter a higidez da atividade realizada e a integridade do sistema de previdência complementar.
O dirigente da entidade de previdência privada é o responsável por gerir os recursos de terceiros inseridos na entidade fechada de previdência, sendo, portanto, responsável solidariamente com os demais gestores dos atos praticados em nome da entidade de previdência privada fechada.
Nessa baila, o art. 39, parágrafo único, da Lei n. 109/2001, esclarece que os demais membros da diretoria-executiva responderão solidariamente com o dirigente indicado na forma do inciso II pelos danos e prejuízos causados à entidade para os quais tenham concorrido. No mesmo sentido é a previsão constante no art. 35, § 6º, da Lei, que reconhece aos dirigentes a responsabilidade solidária pelos atos geradores de prejuízos para as entidades de previdência privada de caráter fechado.
Isso posto, numa leitura conformativa e sistemática da legislação nacional, percebe-se que os dirigentes além de responderem pelos danos causados às entidades de previdência privada, podem ainda responder pelos atos ilícitos decorrentes de ato de improbidade administrativa.
É que, a nova Lei n. 14.230/2021, em seu art. 3º, § 1º, previu a possibilidade de a pessoa física também responder por ato de improbidade, e não apenas a entidade violadora da moralidade pública qualificada. Nesse talante, para haver a responsabilização dos dirigentes de previdência privada, necessário que se torne evidente e comprovado que houve participação e recebimento de benefícios diretamente por parte dele – o que, sem a devida comprovação, finda por minar qualquer fundamentação atributiva de responsabilidade pessoal do dirigente por ato de improbidade administrativa quando não comprovada a reversão para seu próprio benefício.