Felix Contreras é um talentoso poeta, ensaísta e jornalista cubano. Conheci-o em fins de 1989, quando esteve em Natal, acompanhado de outros intelectuais e artistas cubanos. Aqui discutimos e realizamos a I Semana de Arte Cubana, com exposição de quadros no campus da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e sarau poético na Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), com leitura de poemas feita por ele e minha tradução. O evento foi um sucesso e o início de uma grande amizade!
Logo no primeiro poema de seu livro “Meus poemas brasileiros” (5/10/2010), menciona a mim e a Mário Quintana, que havia conhecido em Porto Alegre, em 1983…
Meus poemas brasileiros
Por Felix Contreras
“No Brasil pegam avião para mim
Com um bilhete de avião dos amigos brasileiros
eu viajei todo o Brasil e conheci muitos poetas
Rio de Janeiro e sua gente tão próxima à de Havana
São Paulo e suas máquinas
Paraíba com a justiça que sonha a mudança verde
Natal onde árvores paredes livros poemas
levantam a casa de Horácio Paiva
e assim que se chega e fica o pão sobre a mesa
e se escreve um poema
posso falar de Mário Quintana
morador dos hotéis
de Porto Alegre onde jantei com ele
traficante de ironias, piadas e formosas secretárias
sabendo que a poesia é mal remunerada
mas ninguém como o poeta (…)”
Convidado por sua amiga gaúcha Naira Hofmeister, chegou a Porto Alegre em 1983 e ali conheceu e entrevistou o poeta, tradutor e jornalista Mario Quintana (1906-1994), segundo ele um dos maiores poetas do século XX, que adorava duas coisas: a conversa no café da manhã e os hotéis, morando, à época, num deles, o Hotel Royal, no centro da cidade, onde era hóspede perpétuo.
Contreras diz que acordara cedo naquele dia e o poeta já o esperava para compartilhar o café…
Enfim, eis o teor da graciosa conversa, entremeada de informações, lirismo e humor:
“- Mario, você gostava muito de cinema… fale-me sobre essa sua afeição…
- Olha, primeiro foi o rádio, desde 1922, quando vai ao ar, e mais: desde a década de 1930, quando inicia o grande sucesso de fazer as pessoas informadas e trazia o mundo à casa da gente, mostrando-se um veículo de informação e de lazer… Eu, como minha mãe, fui um dos fieis ouvintes daqueles programas que lançavam artistas como Carmen Miranda, Mário Reis, Francisco Alves, Noel Rosa, entre outros…
- E as radionovelas?…
- Sim, fizeram muito sucesso. A primeira, “Em busca da felicidade”, na Rádio Nacional, de autoria de um cubano de sua ilha, Leandro Blanco… fez muito sucesso em 1941. A grande paixão de minha mãe, ouvindo as Rádios Philips, do Rio de Janeiro e Record, de São Paulo… Minha juventude é a era de ouro do rádio, com as radionovelas e programas de auditório… O rádio é um instrumento de grande utilidade pública com sua linguagem direta, além de ser um meio de lazer e entretenimento.
- Poeta – pergunta-me Mario – quando se inaugura o rádio em Cuba?
- Mário, lá, como no Brasil, em 1922. E vou dar outras dicas para você dessa relação do rádio em Cuba e no Brasil… Na introdução da publicidade do jornalismo radiofônico no Brasil, vieram cubanos, empregados da agência norte-americana United Press e da agência de publicidade McCann-Erickson, em Havana…
- Meu pai?… Só gostava de ouvir noticiários, sobretudo o Repórter Esso, nacional, do Rio, e outro daqui de Porto Alegre, o da Rádio Farroupilha…
- Sim, e o cinema?… Eu li poemas seus que falam do cinema, dos filmes…
- Tá certo… quase passei toda minha juventude indo a cinemas, assistindo a filmes…
- Lembra o cinema mudo?
- Lembro… Theda Bara, Claudete Colbert, Mary Pickford…
- Então, lembra também daquelas superproduções…
- Cleópatra!!!… Estrondoso sucesso de Cecil B. de Mille, com aquele cartaz que ainda me seduz…
- Cinema europeu?
- Lembro-me… Um cinema de menos barulho, da publicidade… Eu gostava mais dos filmes franceses. Os franceses gostavam de abordar o adultério, e os italianos, as “chamas da paixão”…”
“Estamos na cozinha tomando café, graças ao serviço de Sandra, uma belíssima gaúcha, empregada de Mario e estudante de literatura na universidade… “Olha, Mario, bela a moça, hein?…” “Não acho, não…” “Mario, como é possível? Você não a enxerga?…” “Ela é feia, muito feia!” “Mario, ela é feia?…” “Sim, porque não é minha.”

