Alfredo Neves, já famoso entre nós como poeta, artista plástico e crítico de arte, agora nos surpreende com um romance, em breve a ser lançado. Obra exemplar, “A Ilha Esquecida” tece o encontro de ficção e factualidade – esta, palco, teatro existencial, e aquela, sonho e movimento. A vida em sua realidade maior. A vida como foi e como poderia ter sido. Afinal, como dizia poética e sabiamente Calderón de la Barca, “la vida es sueño y los sueños sueños son”. Por outro lado, a arte cumpre uma função ontológica importante ao justificar, estética e filosoficamente, a existência humana. Nesse sentido, lapidar é a frase de Schopenhauer: “A arte justifica o sofrimento da vida”.
Alfredo tem participado com destaque da vida pública macauense. Com vários livros de poesia publicados, é um dos fundadores e atual vice-presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA.
Convém lembrar que ele é filho adotivo de Macau – filho do coração!, expressão usada quando queremos destacar o amor, sobretudo quando a mãe também foi adotada pelo filho que lhe é devoto e, estudioso, conhece a sua história, sabe de seu passado épico, reluzente e lendário.
A ancestral Ilha de Manoel Gonçalves, com casario, igreja e fortim, foi tragada, entre os anos de 1800 e 1830, pelas águas do Atlântico, forçando sua população a transferir-se para a vizinha Ilha de Macau. Assim, não se pode esquecer ou subestimar o profundo elo existencial entre elas: uma é a continuidade humana da outra.
Sim, Macau é uma ilha, ligada ao continente por um istmo artificial, ao qual chamamos, em nossa intimidade, simplesmente de “aterro”.
Alfredo Neves não resiste à modéstia e, em sua nota introdutória ao livro, se identifica mais como poeta que como prosador. Entretanto, a obra que nos apresenta repõe a verdade, pois aqui também a ficção revela o talento do artista. Com habilidade, nos passos do historiador, que lhe emprestam harmonia, reinventa fatos, aspirações e sonhos e nos coloca frente a um cativante realismo mágico!
E segue no caminho da verdadeira arte, que tem esse dom maravilhoso: o de nos transportar às realidades sonhadas, pois, como dizia Novális, célebre escritor romântico alemão, “o mundo se converte em sonho, e o sonho se converte em mundo.”
O autor é fiel à ficção, pondo-a em harmonia com a história e o meio social. Como se mirasse não os fatos em si, mas a sua alma, com todas as suas faces, mesmo aquelas que em princípio não víamos, agora reveladas.
Enfim, a obra, de inequívoco valor, enriquece particularmente o panorama literário macauense, predominante lírico, no segmento ficção, formando ao lado de Aurélio Pinheiro, José Mauro de Vasconcelos, João Fagundes de Menezes, Daniel Násser, Cláudio Guerra e outros.
(*) Horácio de Paiva Oliveira – Poeta, escritor, advogado, membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN, da União Brasileira de Escritores do RN e presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA.