Não há fórmula ou escola para Walt Whitman. Vivendo em pleno século XIX, poderia ter sido romântico, parnasiano ou simbolista. Mas, não. É um contemporâneo.
“Pioneers! O Pioneers!” é o título de um de seus famosos poemas contidos em “Leaves of Grass” (“Folhas de Relva”). Ele que também foi um pioneiro, e, neste caso, das letras, desbravando horizontes na arte poética. Aboliu métrica e rima e adotou o verso livre, longo, bíblico.
E nesse seu estilo escreve essa joia, que extraio de seu oceano de pérolas, aqui na esmerada tradução de Oswaldino Marques:
UMA VEZ ATRAVESSEI UMA CIDADE POPULOSA
Uma vez atravessei uma cidade populosa ilustrando o meu
espírito, para proveito futuro, com suas suntuosidades,
arquitetura, costumes, tradições…
Mas, agora, de tudo dessa cidade, eu me lembro somente de
uma mulher que casualmente encontrei e que me
deteve por ter eu encontrado graça aos seus olhos.
Permanecemos juntos muitas noites e dias seguidos…
Tudo o mais para mim há muito caiu no esquecimento;
Eu me lembro só, na verdade, dessa mulher que apaixonadamente
se juntou a mim.
Ainda hoje andamos à toa, nos amamos e outra vez nos
separamos.
Às vezes ela me segura pela mão para que eu não parta,
E a pressinto juntinho de mim, os lábios mudos, aflitos e
trêmulos.
Trabalhou durante toda a sua vida nesse livro. Reescreveu-o várias vezes e a cada edição adicionava novos poemas. Afora a edição póstuma (a 10ª.) e definitiva, publicou-o em 1855, 1856, 1860, 1867, 1870-1871, 1876, 1880, 1889 e 1892 (ano de sua morte).
Nasceu em West Hills, Nova Iorque, em 31 de maio de 1819 e faleceu em Camden, Nova Jérsei, em 26 de março de 1892.
Atualmente é reconhecido como um dos maiores poetas americanos (senão o maior, para alguns), ocupando lugar de destaque na moderna poesia ocidental. Mas nem sempre foi assim. Como observa Sérgio Milliet, no verbete sobre ele escrito e inserido em seu livro “Obras-Primas da Poesia Universal”, “Esse seu livro de poemas (referindo-se a “Folhas de Relva”), publicado pela primeira vez em 1855, foi hostilmente recebido pela crítica e pelo público do país, o mesmo sucedendo às várias edições que, sempre acrescidas de novos poemas, depois disso se publicaram. Nos últimos anos de vida, porém foi feita justiça à obra-prima de Whitman.”
Além de poeta, Walt Whitman escreveu ensaios e exerceu o jornalismo. Do ponto de vista moral, foi, sem dúvidas, um grande humanista, ativista dos direitos humanos, cantor da fraternidade, da solidariedade e do amor entre os seres humanos, da natureza e da democracia. Estes valores constituem verdadeiros ícones em seu plano estético-filosófico-literário, e muitos o citam como o poeta da democracia. No seu livro em prosa, “Democratic Vistas”, adverte, entretanto: “Temos escrito demasiadas vezes a palavra Democracia. Contudo, nunca será demais eu repetir que essa é uma palavra da qual o conteúdo verdadeiro dorme ainda, longe de ser despertado, não obstante a repercussão e as muitas tempestades iracundas, da língua e da pena, com que suas sílabas têm sido articuladas. É uma grande palavra, cuja história imagino que permanece por ser escrita, pois essa história ainda está para ser posta em prática.”
Defensor da igualdade de direitos entre negros e brancos, ou melhor, entre todos os homens, insurgiu-se contra a escravidão, participando da guerra civil americana (a chamada Guerra de Secessão), que se estendeu de 1861 a 1865, servindo como enfermeiro, e dela saindo doente (adquiriu uma paralisia que o incapacitou até o fim de seus dias).
(*) Horácio de Paiva Oliveira – Poeta, escritor, advogado, membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN, da União Brasileira de Escritores do RN e presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA.