As recentes notícias sobre se o vice-governador do Rio Grande do Norte assume ou não caso a governadora Fátima renuncie para disputar o senado, tem uma roupagem que não está aparente.
Estamos falando sobre as finanças do Estado para 2026.
Para entender a situação orçamentária e fiscal do RN não basta técnica, é preciso contexto histórico, estrutural e político. Os números extraídos do SIGEF diagnosticam o limite do limite orçamentário, apesar do excelente trabalho fiscal dos últimos anos que levou o RN a ser um dos estados que mais arrecadaram. Apesar disso, gastos com pessoal galoparam e investimentos caíram vertiginosamente.
Em linguagem popular, o dinheiro entra, mas evapora em folha, rigidez e custeio.
Diante do que iremos expor aqui, uma pergunta terá que ser respondida: o RN ainda é governável com as regras atuais, ou será preciso uma reforma profunda, impopular e antipolítica?
Para responder, os dados inicialmente propostos do Orçamento para 2026 mostram uma ínfima capacidade de investimento, estrangulada por três vetores óbvios, mas ignorados por muito tempo. O primeiro se refere ao gasto com Pessoal. O RN está entre os estados com maior proporção de folha sobre a Receita Corrente Líquida. A cada ciclo eleitoral ao longo de décadas surgiam e surgem novas carreiras, reajustes, reenquadramentos. Parte disso é justa, parte não.
No final, sobra quase nada para planejamento e políticas de médio e longo prazo.
O segundo vetor é o custeio obrigatório. Ele cresce não porque governos querem. Cresce porque a máquina envelhece, a demanda aumenta e os contratos se acumulam. Tudo sobe: energia, contratos médicos, manutenção, aluguel, TI. Nada volta. É uma parede rígida, pouco elástica, pouco ajustável e permanente.
O terceiro ponto é a multiplicação de carreiras e regimes próprios. Não se trata apenas de salários atuais, mas de compromissos futuros como promoções automáticas, pisos ascendentes e impacto previdenciário crescente. Mesmo com o aumento da receita nos últimos anos, existe insuficiente para cobrir o custo que avança.
E ainda há o monstro silencioso chamado de vinculação orçamentária que garante continuidade de políticas, mas reduz a margem de manobra. Boa parte da receita já nasce carimbada.
Resultado? o investimento do RN dependente quase totalmente de Brasília, bancos internacionais – como o empréstimo do Banco Mundial – ou emendas. Com recursos próprios, o estado investe quase zero e em anos ruins, zero.
Dito de forma direta, não existe espaço para um projeto de desenvolvimento financiado pelo Tesouro Estadual.
Então, a provocação é: o elefante ainda é governável?
Sim e não. Estamos estourando o limite da sobrevivência administrativa. Governável com ambições hoje é impossível. E existem bombas armadas para explodir: previdência, demandas judiciais, recomposições salariais e pressões setoriais.
O RN caminha aceleradamente para um colapso fiscal. As margens são tão estreitas que qualquer choque externo como queda do ICMS, frustração de FPE, reajustes e aumento previdenciário, podem desencadear uma crise institucional. É como pilotar um avião com combustível na reserva e sem plano de pouso.
E é aí que o roteiro começa a parecer déjà vu. Minas Gerais, em 2003, estava em colapso administrativo, déficit, salários atrasados. A saída definida por Aécio Neves e Antônio Anastasia foi dura e chamada na época de choque de gestão. Em Minas, funcionou. Doeu, mas funcionou.
Diante do exposto, a nova provocação seria: a terra de Cascudo precisa de um choque de gestão?
A resposta é sim. O problema é que isso não depende de um governador. Depende de um pacto: Executivo, Assembleia, Tribunal de Contas, Ministério Público, Judiciário e categorias entendendo que sem ajuste, não existe Estado, só folha (atrasada), custeio e discurso. Todos os poderes teriam a seu quinhão de sacrifício para que em um futuro próximo, o Estado, as pessoas possam ter esperança em um futuro promissor.
Para isso, seria necessário adotar algumas medidas inescapáveis como reorganização de carreiras e freio em progressões automáticas, criando sustentabilidade sem retirar direitos; reestruturar o custeio, cortando duplicidades, renegociar contratos e centralizar compras; institucionalizar metas e resultados, com relatórios trimestrais públicos e criar um programa permanente de sustentabilidade fiscal, revisando benefícios fiscais, melhorando cobrança da dívida ativa e modernizando a receita.
Sem capacidade de investimento, será necessário redefinir prioridades: energia renovável, segurança hídrica, infraestrutura produtiva, inovação e tecnologia. Fora as manutenções óbvias como saúde e educação. Sem isso, o Estado continuará girando no mesmo ciclo de escassez e improviso.
A conclusão das provocações é muito dura. O RN, para quem é atento a física ou filmes de ficção, está na borda do horizonte de eventos, no limite. Governá-lo tem que ser obra de um pacto institucional, não apenas de um governador. Sem reorganização profunda, o cenário previsto é de colapso.
Resta a provocação final e talvez a mais importante: Os Poderes farão o que precisa ser feito?
