Como o povo seridoense precisou renascer e sobreviver ao castigo da seca, 13 anos depois o Açude Gargalheiras ressurge cheio, como sinônimo de fé, esperança e a certeza de que os dias melhores chegaram para os acarienses que tanto sonharam com esse momento de sangria.
Quem viveu o período de seca, após 2011, relembra os momentos de dificuldade: “Esse período que passamos aqui na nossa cidade de seca, de escassez de água foi muito complicado. A última sangria foi em 2011, entre 2014 e 2021 – mesmo período da pandemia – o açude recebeu uma boa quantidade de água, mas não foi o suficiente. Foi o período do chafariz, em que as pessoas faziam fila na madrugada para tentar conseguir um pouco de água, cada um saía em busca como podia: uns iam de carroça, outros a pé. Um momento muito complicado! ”, relembra Wellington Pereira, morador de Acari.
Mas agora, fé e gratidão são palavras de ordem para quem vai ao mirante do açude: “Agora, o momento é de agradecer a Deus. E com fé em Deus chegaremos a presenciar mais uma sangria do nosso açude Gargalheiras”, afirmou Wellington durante a espera, na tarde de quarta-feira (03).
Além dos moradores da cidade, muitas pessoas vindas de outros municípios, também aguardavam em clima de celebração: “Eu sou de São José do Seridó, estava em casa e não aguentei de ansiedade, vim ver de perto essa maravilha que é o Gargalheiras. Um momento tão importante e grandioso para todos nós seridoenses. E estarei comemorando no dia da Festa da Sangria, no próximo domingo”, contou dona Aparecida.
LEVANDO O GARGALHEIRAS PARA QUEM ESTÁ DISTANTE
Muitos acarienses apaixonados pelo Gargalheiras não podem estar presentes, vivendo de perto a emoção da sangria. Foi pensando nessas pessoas que Vicente Cassiano, morador de Acari, decidiu acompanhar todos os acontecimentos e expectativas com registros nas redes sociais.
Vicente relembra que o dia 18 de fevereiro foi um divisor de águas para encher o reservatório: “Chegamos em 18 de fevereiro de 2024, com apenas 1,38% da capacidade total, já estava próximo do seu volume de não-captação, usávamos de balsas para poder pegar água. Nesse dia aconteceu uma procissão fluvial de Nossa Senhora de Lourdes, padroeira da nossa comunidade, Ela percorreu as águas já embaixo de chuva e ali nós confiamos que as coisas seriam melhores, que teríamos surpresa e seríamos abençoados com a sangria. Daquele dia 18 de fevereiro até o dia de hoje, 03 de abril, são 45 dias que o Gargalheiras recebe água”.
Os primeiros registros aconteceram ainda durante a procissão e a repercussão ganhou o mundo: “Foi desde esse acontecimento, que usei das minhas redes sociais para levar a informação, inicialmente para o público local, mas foi ganhando repercussão e hoje tem gente que possui vínculo com Acari que acompanha até de fora do Brasil”, contou Cassiano acrescentando: “Tudo que eu puder fazer para levar a informação, estou fazendo. Fazendo transmissão ao vivo, postando vídeo. É só emoção”.
Cassiano relembra um dos momentos de grande comoção e expectativa aconteceu na última segunda-feira (01): “Cada dia é uma nova expectativa, fizeram uma grande festa. Teve música, churrasco, uma grande confraternização. Chegou a ter quase 2 mil pessoas aqui no mirante do Açude Gargalheiras. Teve gente que fez vigília durante a madrugada esperando”.
O homem que ajudou a construir o Gargalheiras
Construído na segunda metade dos anos 1950, na Comunidade Gargalheiras – município de Acari, o Açude Marechal Dutra (mais conhecido como Gargalheiras) é o quarto maior reservatório do Rio Grande do Norte. Em 2023, foi reconhecido por lei como patrimônio cultural, histórico, geográfico, paisagístico, ambiental e turístico do Rio Grande do Norte.
A espera de mais uma sangria, a reportagem do Diário do RN encontrou Severino dos Santos. Aos 88 anos, tomado por muita emoção, ele relembrou a época quando participou da construção do açude. “O ano era 1958. Trabalhava no serviço de concreto. Fazia concreto para as paredes.
Trabalhei dois meses porque fui embora para o sul. Quando eu saí, estava quase na metade do serviço, terminou em 1959. Agora, eu não me lembro do primeiro ano que ele sangrou. Faz 13 anos que ele sangrou e estou ansioso. Ainda hoje me emociono quando isso acontece”