Por Ana Beatryz Fernandes
A hanseníase, uma doença que remonta a milênios, continua a desafiar a saúde pública no Brasil, onde quase 20 mil novos casos foram registrados entre janeiro e novembro de 2023, de acordo com o Painel de Monitoramento de Indicadores da Hanseníase do Ministério da Saúde. A Região Nordeste é a mais afetada, contabilizando 7.779 diagnósticos. A Secretaria de Estadual de Saúde foi procurada pela reportagem, mas não forneceu números até o fechamento dessa reportagem.
Com o país ocupando o segundo lugar no mundo em incidência da doença, a luta contra o preconceito e pela conscientização torna-se cada vez mais urgente. Desde a década de 1980, o Ministério da Saúde implementa medidas significativas para desestigmatizar a condição, incluindo a proibição do termo “lepra” e o investimento em campanhas educativas.
Além disso, desde 2009, o último domingo de janeiro é marcado como o Dia Nacional de Combate e Prevenção da Hanseníase, uma data fundamental para reforçar a importância do diagnóstico precoce e dos tratamentos disponíveis na rede pública. Esta reportagem aborda os aspectos clínicos da hanseníase, as iniciativas em curso para fomentar a conscientização e as histórias de superação que emergem desse contexto.
Todo ano, no mês de janeiro, a sociedade é convidada a refletir sobre a hanseníase e seus impactos, por meio da campanha Janeiro Roxo. Criada em 2016, a ação busca desmistificar, alertar sobre a importância do diagnóstico precoce e combater os estigmas que ainda cercam a doença. Em entrevista ao Diário do RN, a Dra. Bárbara Carriço, Presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia – Regional RN (SBD-RN), detalha os objetivos e os desafios dessa importante iniciativa.
A campanha “Janeiro Roxo” nasceu com a missão de esclarecer a população sobre a hanseníase, uma doença curável, mas que ainda é marcada por preconceito e desinformação. “O objetivo principal é promover o diagnóstico precoce, quebrar preconceitos e garantir que as pessoas afetadas tenham acesso ao tratamento adequado, evitando complicações e transmissibilidade”, explica Dra. Bárbara Carriço.
A hanseníase é uma doença transmitida por gotículas respiratórias de uma pessoa infectada para outra pessoa suscetível, geralmente por meio de contatos próximos e prolongados. Contudo, um dos maiores mitos é sobre a forma de transmissão. “Um dos principais mitos é que a doença é altamente contagiosa. Na verdade, o simples toque não transmite a hanseníase, e ela pode afetar qualquer pessoa, independentemente da higiene ou condição socioeconômica”, esclarece a Dra. Bárbara.
Os sinais da hanseníase são muitas vezes sutis e podem ser facilmente confundidos com outras condições de pele. Os principais sintomas incluem manchas esbranquiçadas, avermelhadas ou amarronzadas na pele, com alteração ou perda de sensibilidade ao calor, dor ou toque. A Dra. Bárbara orienta: “É importante estar atento também a sensações de formigamento ou dormência nas extremidades, diminuição da força muscular, especialmente nas mãos e pés, e engrossamento dos nervos periféricos.”
“O diagnóstico precoce é essencial para evitar complicações graves, como deformidades físicas e incapacidades permanentes. Além disso, o tratamento iniciado precocemente interrompe a transmissão da doença, protegendo a comunidade e reduzindo o impacto do estigma social”, enfatiza Dr. Bárbara.
O tratamento da Hanseníase, cura e perspectivas
A hanseníase tem cura, e a poliquimioterapia (PQT) é o tratamento mais eficaz para erradicar a doença. O tratamento, que pode durar entre seis e 12 meses, dependendo do tipo da doença, é oferecido gratuitamente pelo SUS e interrompe tanto a transmissão quanto o desenvolvimento de complicações. Com a adesão ao tratamento, a maioria dos pacientes se recupera sem deixar sequelas.
Um dos maiores desafios enfrentados pelos pacientes com hanseníase é o estigma social. A sociedade, muitas vezes, ainda associa a doença a preconceitos históricos, o que dificulta a busca por tratamento. “A sociedade pode contribuir disseminando informações corretas sobre a doença, evitando o uso de termos pejorativos e acolhendo as pessoas diagnosticadas”, afirma Dra. Bárbara. A inclusão social e o tratamento respeitoso são fundamentais para que os pacientes se sintam encorajados a procurar ajuda médica.
Campanhas de conscientização: aliadas na luta contra a desinformação
As campanhas de conscientização desempenham um papel crucial na detecção precoce da doença. Dra. Bárbara destaca: “As campanhas de conscientização têm um papel crucial em educar a população sobre os sinais e sintomas da hanseníase, incentivando as pessoas a buscarem atendimento médico.”
Neste Janeiro Roxo, a SBD traz uma novidade: a campanha “Enredos da Hansen(IA)se”, que usa inteligência artificial para criar um funk brasileiro. “A letra do funk é composta com base nas palavras e nos temas mais comentados sobre hanseníase, destacando a importância do diagnóstico precoce e do tratamento”, explica Dra. Bárbara. A ideia é alcançar um público mais jovem de forma criativa e inovadora.
Além da campanha digital, estão sendo realizadas capacitações de profissionais de saúde para aprimorar o diagnóstico e o manejo da hanseníase. O foco é garantir que os profissionais estejam bem preparados para identificar e tratar a doença de maneira eficaz.