Vic Kabulosa, uma artista preta da zona norte de Natal, define seu nome artístico como uma compilação de muitas vozes, afinal, ser Kabulosa num cenário de estigmas e preconceito é um enorme desafio para ela, que em meio a expressão cultural, é uma cantora e intérprete trans.
“Foi a armadura que criei para resistir aos traumas, medos e abandonos que um corpo LGBTQIA+ vivencia na periferia. Eu sou alegria, amor da cabeça aos pés, absurda e acima de tudo sou a arte da resistência”.
Kabulosa afirma não saber ao certo de onde surgiu essa ligação com a música, mas acredita já ter nascido com essa missão. Desde a infância, a música guiou seus passos, pois quando ela costumava ir aos lugares, brincava com as melodias para decorar coisas, usando-as como marcação de tempo, quantas músicas demorou a chegar em um determinado lugar.
“Hoje, estudando licenciatura em Música na Escola da Música da UFRN, entendo que todo esse processo cognitivo com a música foi importantíssimo no meu desenvolvimento pessoal e social. A interpretação chegou junto com a maturidade artística, bebo de muitas referências diferentes e contraditórias, sendo assim todas elas fazem parte de mim também, mas cada artista tem sua forma de sentir e transmitir e o palco é minha casa, o lugar onde interpreto, sinto e vivencio sempre como se fosse a última vez”.
Kabulosa cresceu cantando na igreja e na adolescência assumiu alguns vocais numa banda de baile, Flor e Cheiro, encabeçada pelo professor Ailson Saraiva.
Em 2019 ela iniciou sua profissionalização na música, como licencianda, entrou na EMUFRN em 2020 e desde então, ela vive inteiramente para a música, até que um dia possa viver dela.
Dentre tantas interpretações e expressões culturais, Kabulosa afirma que sua maior inspiração sem dúvida nenhuma é a cena potiguar, ela já esteve nos palcos de eventos culturais de grande impacto no cenário musical do RN, como o Festival DOSOL, Spotted, dentre outros.
“Sempre fui muito fã da galera que fez e faz acontecer a arte na nossa cidade e hoje sou muito realizada em poder contribuir para essa construção. Além de ser muito fã dos movimentos sociais que construíram a música brasileira, como o Tropicalismo, Jovem-Guarda, Funk, etc”.
Em dezembro de 2023, Kabulosa participou do segundo episódio do projeto ‘Elas no Som’, disponível gratuitamente no YouTube. Dentre tantas nuances de sua arte e vivências, apesar das dores e dos amores, Vic destacou a forma que a consagra como uma artista, é mergulhar nessas experiências e transformar-se em arte, uma sacada de usar todas as referências que a cercam e que a constroem. “E aí também vem de muitos, muitos lugares diferentes, que também veio do corpo da minha mãe, de ser uma mulher negra, de ocupar, de resistir, de fazer a minha vida dar certo”.
Ainda no primeiro semestre deste ano, Vic pretende lançar o EP KABULOSA, um projeto com músicas autorais, que trazem uma pluralidade artística, trazendo uma linhagem urbana e muitas texturas sonoras para consolidar de forma sonora o trabalho autoral de uma personalidade tão diversa. Representando vários corpos e lutas, a KABULOSA é uma composição de muitas referências que a construíram desde a sua infância na Zona Norte de Natal até agora.