Com elegância, simplicidade e um sorriso no rosto, completamente à disposição para contar muitas histórias, foi assim que Dom Jaime Vieira recebeu a equipe do Diário do RN em sua última semana como administrador apostólico. Após a nomeação do novo arcebispo Dom João Santos Cardoso, que toma posse no sábado (07), Dom Jaime passa a bispo emérito, o 3º bispo emérito ainda em atividade, assim como Dom Heitor de Araújo Sales e Dom Matias Patrício de Macêdo, que respectivamente foram o 4º Arcebispo Metropolitano e 5º Arcebispo Metropolitano.
Advindo de uma família muito católica e uma mãe bastante religiosa, estes foram os primeiros passos na vida do menino que desde o nascimento já diziam que seria padre. O chamado vocacional aconteceu aos poucos, os problemas na comunidade e do meio em que vivia, também foram propulsores para sua carreira eclesiástica.
“Vivi até os 14 anos na fazenda onde eu nasci, tinha uma escola isolada que dava aula até a terceira série, depois fui para Santa Cruz morar na casa paroquial, com o pároco da época que tinha uma ação social muito intensa de promover a saúde e atendimento às crianças, já que havia uma mortalidade infantil imensa por falta de condições básicas. Para ser padre, eu tive que sair de casa e completar os estudos. E isso é muito interessante: depois que ingressei no seminário, nunca pensei em sair. Tudo que eu ia vendo, pôde ser acrescentado como experiência para que eu tivesse essa visão mais ‘alta’ de tudo”.
Dom Jaime recorda sobre outro período enfrentado pela igreja, no século XX, que durante uma crise de identidade do Clérigo, a visão de uma eminentemente pastoral, foi dando lugar a uma igreja comunitária de comunidade circular de participação como sendo centro hierárquico, mas numa dimensão mais ampla de comunhão de participação. Essas transformações ao longo dos anos foram fundamentais para sua construção como padre e bispo e, diante dessa necessidade, Dom Jaime se formou em Sociologia Política na Fundação José Augusto/UFRN.
“Eu me validei, eu posso dizer assim, desta ciência social que me deu mais abrangência e visão da realidade como um todo, que para mim é o grande problema da humanidade e muitas vezes de quem está à frente do poder, falta esta capacidade de formação que proporciona relacionar os fatos, ter uma visão da história ontem, de hoje e do que virá, e assim dá para ver onde estão os gargalos, as carências, as dificuldades e muita gente não enxerga”.
Para Dom Jaime, o olhar eclesiástico em junção com as ciências sociais foram uma combinação indispensável em sua pastoral. “Dentro desse contexto, eu como padre deveria ter uma profissão além de ser padre, deveria ser formado em alguma carreira, uma área de formação superior que certamente iria complementar o exercício do meu ministério. Não é só chegar dizer não quero isso, não quero aquilo, eu vou suprimir isso aqui. E depois, são questões que trazem um prejuízo irreparável porque uma medida que se toma do ponto de vista sócio, político, econômico e até também a maneira de evangelizar, se não tiver lucidez, sabedoria e experiência que dê sustentabilidade a aquilo que se vai tentando construir, causará um prejuízo”.
As ciências sociais e os debates socioeconômicos, alinhados com o olhar sensível às causas sociais, até os dias atuais, segundo Dom Jaime, foram fundamentais para sua trajetória, mas para a humanidade, é necessário, sem ideologias, pensar no bem-comum e no combate às desigualdades sociais, uma questão que ele pontua como vida ou morte.
“Nesta perspectiva de ajudar para o desenvolvimento comunitário, humano, dignidade humana, depois cheguei a Natal, passando por Campina Grande, também com este viés, sobretudo de sensibilidade e abertura para caminhar com a sociedade como um todo. Eu, na minha identidade de pastor, de bispo, de religioso, mas inserido numa realidade sociopolítica e econômica transformadora, com os desafios de cada tempo, foi muito importante”.
Após a nomeação de Dom João Santos como 7º Arcebispo Metropolitano de Natal, Dom Jaime Vieira se torna bispo emérito com ótimas expectativas a respeito da nova pastoral. O sentimento, fazendo um balanço de sua passagem pela Arquidiocese de Natal, ele define como uma missão cumprida.
“Realizei o que devia fazer, nós bispos ficamos eméritos, mas não ficamos aposentados. O bispo permanece bispo até morrer, é uma ordenação, um sacramento. Vou viver a minha condição de bispo em outra fase, também sempre aberto para colaborar, para servir, para o que for possível, a experiência que temos deve contar para tantas coisas boas que vivi”.
Dom Jaime, durante a entrevista, fez questão de mencionar a necessidade dos debates pautados na natureza, nas políticas públicas, na pluralidade e no respeito, dando destaque a um seminário marcante do qual participou, onde líderes das mais variadas religiões estavam presentes, respeitando-se de forma mútua e generosa; experiências como essas, ele afirma terem feito parte de seu ministério, ressaltando que a cada dia mais, o bem-comum deve ser valorizado por cada ser humano para que a dignidade humana seja de fato respeitada.

