MANXA: O ESCULTOR QUE TALHOU A HISTÓRIA EM BRONZE, PEDRA, MADEIRA E MEMÓRIA
O SÍMBOLO QUE DESAPARECEU
Já escrevi sobre Manxa para diversos veículos de imprensa do estado. Agora, com alguns detalhes adicionais e em formato de coluna, volto a registrar a trajetória desse brilhante e saudoso talhador, cuja arte está presente em repartições públicas, cidades do Brasil e também em diferentes partes do mundo. Para compreender sua obra, é preciso antes conhecer quem foi o artista. Há arte em muitas esquinas, mas poucas ganham a dimensão da admiração popular e do reconhecimento histórico. É o caso do potiguar Ziltamir Sebastião Soares de Maria (1949–2012), conhecido como Manxa, um dos grandes nomes da escultura no Rio Grande do Norte. Filho de Maria de Lourdes Soares de Maria e de Teófanes Maria.
Sua obra mais emblemática foi o Monumento ao Atleta, erguido em 1975 no entorno do Machadão, o lendário estádio natalense demolido para dar lugar à Arena das Dunas. A escultura metálica, formada por três atletas de braços erguidos sustentando os aros olímpicos, simbolizava a união dos povos. Admirada e fotografada por milhares, resistiu por décadas até sucumbir à ferrugem e ao descaso. Quando desapareceu definitivamente em 2001, ficando o vazio, e a certeza de que a memória da cidade também se esvai quando a arte pública é esquecida.
RAÍZES E TRAJETÓRIA ARTÍSTICA
Nascido em São Vicente, Manxa é neto de Maria Antônia do Santíssimo (1890–1974) e primo dos artistas plásticos Iaponi Araújo (1942–1996) e Iaperi Araújo, todos precursores da Arte Naïf potiguar. Incansável, o escultor teve projeção nacional e internacional, trabalhando com bronze, granito, mármore e madeira.
Seu domínio técnico vinha do entalhe, prática ancestral que exige concentração, esforço físico e precisão. Ferramentas como formão, goiva e lima moldavam as matérias-primas em esculturas vigorosas e simbólicas. Se hoje a tecnologia traz tornos mecânicos e impressoras 3D, para Manxa, a essência permanecia no toque direto entre a mão e a matéria.
O ENTALHE E SUA HISTÓRIA

O entalhe acompanha a história da humanidade. Foi usado na África Oriental, no Egito, na Itália, em Portugal e floresceu no Barroco europeu, movimento iniciado no século XVI. No Brasil colonial, nomes como Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, e Mestre Valentim eternizaram a técnica em igrejas e prédios públicos.
Na história universal, Michelangelo talhou obras que atravessaram os séculos, como a Pietá e os afrescos da Capela Sistina. Manxa, em nosso tempo, integrou-se a essa tradição ao imprimir sua marca na paisagem urbana potiguar.
A PRESENÇA NA CIDADE

A arte de Manxa está por toda Natal, ainda que parte tenha sido silenciada pelo tempo ou por mãos indevidas. Destacam-se ainda: o mural entalhado na Reitoria da UFRN, com máscaras africanas, maias, incas e cubistas; a Imagem de Santana em Caicó; o Pórtico dos Mártires de Uruaçu e Cunhaú; painéis no Banco do Brasil da Avenida Rio Branco e em agências da Caixa Econômica Federal; os entalhes da Pinacoteca do Estado, além do Pórtico dos Reis Magos na BR-101.
LEGADO E MEMÓRIA VIVA
No livro Canção Ingênua (2014), de Iaperi Araújo, artistas e escritores potiguares celebram a herança de Maria do Santíssimo e de seu neto Manxa. Newton Navarro, em 1966, descreveu-o assim: “Manxa firmou, na cidade, uma presença nova. Seu entalhe é quase único na riqueza consciente do seu trabalho.”
Esse legado não pertence apenas ao passado. Pertence à memória coletiva, ao direito de conhecer e preservar quem talhou com as próprias mãos parte da identidade potiguar. A sua arte continua viva, não apenas nas esculturas, mas na responsabilidade que temos de mantê-las presentes na paisagem e na história.